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sábado, 20 de agosto de 2011

Crime de coração

Rua perfeita para cometer um crime . Eu tinha tudo sob controle . Lugar , hora marcada e as próximas vítimas . Meus olhos corriam percorrendo todos os ângulos daquela avenida pouco movimentada . Corria sobre o pouco tempo que me restava e parecia passar mais rápido a cada batida acelerada do meu coração , procurando por um sinal de largada . Era só eu e eu agora . Ah , e uma arma na mão direita sofrendo xiliques como na primeira vez .
Como se fosse hoje eu ainda lembro dessa primeira vez . Eu era ingênua , carente e não tinha cabeça para carregar uma arma no bolso da calça Jean . Esse dia veio rapidamente á minha cabeça quando peguei nessa arma novamente , assim como lembrei da minha primeira vítima . Ele não sabia quem eu era , o que eu fazia . O que eu mais queria era que um dia ele intendesse o que eu era . Ele nunca intendeu . Agora tenho que ficar mais atenta , o próximo está por vir . Á meia noite em ponto ele estará cruzando aquela esquina com ar de suspeito . Tenho que pensar no agora , no daqui a pouco . Carregar a arma . Vestir as luvas e a venda . Ele estará por vir , meu Deus eu fico repetindo isso sem parar , devo colocar um fim agora . Ele estará por vir . E eu ainda não consegui tirar isso da minha cabeça . Ele estará por vir . E eu estarei aqui tremula no meio da rua parada ansiosa com a sua chegada . Ele nunca foi pontual , por que esperaria isso dele logo hoje . Eu realmente estava ficando perturbada com seus defeitos . Deveria pôr um fim nisso,logo.Agora. É agora .
Meia noite e dois da manhã de sexta-feira-treze e ele aproxima-se passando á esquina. É agora,vou colocar a venda.É agora é agora é agora é agora . Não sei porque diabos fiquei parada com aquele pedaço de pano em minha testa o vendo chegar mais perto de mim sem soar qualquer ar de dúvida e espanto . Ele estava ficando louco , perturbado . Meus olhos direcionaram-se automaticamente para sua mão direita suando frio , quase congelado com uma arma presa a ele . Seu braço esquerdo ergueu-se levemente junto a arma mirando meu peito . Ele era louco , tive a certeza agora . Mirei em seu coração . Estávamos os dois parados frente a frente como duas crianças loucas sem saber o que fazer com uma pistola de água entre os dedos , mas prontas para ferir a espera de um primeiro golpe . Ele não há de atirar . Eu sei que eu também não iria conseguir . Hoje não . Olhos penetrantes abaixou a cabeça lentamente , abaixou a arma e deixou escapar uma lágrima . Nenhuma das minhas vítimas reagiram assim . Ele foi o primeiro , e seria o ultimo ? Foi quando ajeitei a arma no bolso da minha calça e vi seu lábio superior tremulo como nunca vira antes . Ainda tremulo sussurrou ''Eu não sabia o que estava fazendo'' ajoelhou-se sobre o chão e completou ''Você não merece um cara como eu,este é o fim'' . Nunca me sentira tão destruída sem ter feito nada . Eu não podia fazer algo agora . Ele estava mais destruído do que eu .
Vendo ele atirado no chão como se fosse um nada , perdi minhas forças de mulher decidida , e tentei buscar forças para tirá-lo do chão sujo ''Eu sempre lhe amei com todos os seus defeitos.Nunca quis lhe ferir.Não desse jeito'' o que eu queria naquele momento era ir correndo e levantá-lo , lhe colocar junto a mim e lhe dizer que , eu fui fraca . Por todos os meus amores eu lutei e matei . Lutei até matar , lutei com todas as minhas forças . Matei a sangue frio . Arranquei do peito todos os sentimentos que ainda poderiam abrir uma ferida ainda maior . Deixei um buraco no coração de quem disse que me amou , como eu queria ter feito com ele agora . Sentir um pouco da saudade que eu senti , mas nunca quis feri-lo.Se quis , não quero mais. Eu lutei por ele , ainda estou lutando . Não chegou a hora de matar . Puxei-o do chão rapidamente e coloquei-o entre meus braços precisando dos dele . Voltei a prometer que nunca o mataria dentro de mim e nem tentaria o matar .
Nesses dois anos ele nunca havia me olhado tão intensamente como agora . Ou talvez eu nunca tenha os visto dessa maneira . Começara a chover e a cena de crime estava intacta como minutos antes da largada final . A prova do crime estava indo embora com a chuva agora , lavando as poucas lágrimas em nossas faces . Ele abraçou-me forte e sussurrou em meu ouvido ''Eu nunca fui o cara certo , mas por você eu mataria , e morreria , para não te ver chorando novamente''. Abaixei os olhos com uma piscada funda e demorada e calei-me . Ele sempre foi o cara certo . Me atiraria na frente da bala de uma pistola para salvá-lo , até pensaria em matá-lo para lhe ver sorrindo se fosse preciso . Eu tentei .

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